domingo, 27 de março de 2022

Jujutsu Kaisen e o retorno da minha fé nos shounens modernos

Ei, pessoal! Tudo bem com vocês? Acabei demorando um pouco mais do que planejado, mudei-me no mês passado, precisei me adaptar ao local novo e outros afins, mas não deixei de pensar no blog, inclusive é provável que daqui uns dias já tenhamos mais uma postagem. Enfim!

Quem me conhece sabe que tendo a fugir das obras mainstream, seja elas séries, animes, filmes, ou o que for. O blog, de certa maneira, reflete isso. Ainda assim, existem posts aqui de obras bem mainstream: Saint Seiya, Naruto, Death Note, One Piece e, bem, JoJo a esse ponto já se pode colocar como tal no Brasil. O fato é que apesar de parecer, eu não tenho síndrome de elitista. Ao menos não mais, já que faz bastante tempo que não tenho 12 anos haha. A minha fuga do mainstream está mais relacionada ao fato de esperar justamente o 'mais do mesmo', então acabo só preferindo não perder o meu tempo. O que, sim, é uma baita de uma besteira. No fim, apenas caio num preconceito muito semelhante ao que tive com Naruto, deixando de consumir uma baita de uma obra por bobagem. A história é a seguinte: esses dias deu-me vontade de rever um arco específico de CDZ, então assinei o teste gratuito da Crunchyroll, assisti em uns 2 ou 3 dias e, assim, me sobrarão mais que o triplo disso. Decidi pegar para ver algum anime curto e acabei escolhendo o Jujutsu pois o character design já me apetecia, além de que há quem é próximo de mim e cujo gosto pessoal confio - que gosta da obra. O resultado foi que em 3 episódios já me amarrei e ontem assisti 10 episódios num dia só. Parece pouco, mas acreditem,  eu raramente assisto qualquer coisa, já que não tenho paciência e acabo buscando ler o material original ou só não consumir nada mesmo, no caso de séries ocidentais. Fato é que Jujutsu é uma obra que me deu vontade de deixar de ser tão cabeça-dura e experimentar algumas outras que eu tenho evitado fazem anos, tipo o Kimetsu, o qual eu talvez comece hoje. 

Enfim! O que Jujutsu tem de tão especial para me ter feito mudar de ideia assim?

O time de protagonistas, Fushiguro, Itadori, Nobara e Gojo-sensei.

Publicado por Akutani Gege na Weekly Shounen Jump desde 2018, até o presente momento. A história começa Itadori Yuuji - o protagonista - ingere um artefato amaldiçoado 'o dedo de sukuna', tornando-se, assim, o receptáculo do próprio Sukuna, uma 'maldição' (o nome qual são chamados os seres espirituais na obra), mas pela surpresa de todos, Yuuji consegue - por ora - conter o controle de Sukuna, conseguindo, inclusive, trocar livremente de 'posição' com ele.

É nítido que Jujutsu Kaisen foi fortemente influenciado por outros shounen de sucesso como Yu Yu Hakusho, Naruto e Bleach. Sério, se você viu/leu qualquer um desses, notará claramente isso. Um colega meu que possui um 'hate' irracional por Naruto ficou bastante ressentido quando falei isso, dizendo que foi apenas por YYH e Bleach. Bem, a própria Akutani afirmou que Kishimoto (não somente ele, como Togashi, Murata Yusuke e Kubo) estava entre suas inspirações para se tornar mangaka. A noção de JJK se inspirou nessas obras é muito importante para um dos principais pontos positivos que vi na obra: a correção de falhas de seus antecessores. 

O primeiro ponto que me chamou atenção foi que desde o início, o ritmo dos eventos é mais acelerado quando comparado com outros mangás shounen. Ao invés de começar com inimigos mais fracos que servem de 'tutorial' para os personagens, os primeiros inimigos já são muito fortes, estando bem acima do nível de seus adversários. Além de isso favorecer o trabalho em equipe - ao invés de focar demais em poucos personagens (geralmente o próprio protagonista da obra) - permite combates interessantes e estratégicos, além de uma melhor fluidez do enredo (existem poucos combates 'filler', até quando uma missão tem um pano de fundo mais simplório, haverá algo de muito importante para o desenrolar da drama nela). Já as obras que citei anteriormente, todas elas possuem várias dessas lutas 'filler', as quais você poderia deixar de ler/ver que não faria tanto diferença. Assim, alguns desses combates são demasiadamente desproporcionais para os protagonistas, de maneira que alguma intervenção semi-conveniente tem de ocorrer. Geralmente, por parte do professor Gojo (o 'Kakashi' de JJK). Gojo-sensei, nos 24 episódios do anime, se mostra num nível de poder que quando comparado até mesmo aos inimigos mais poderosos, parece ser onipotente. Não a toa, ele é referido como o mais poderoso feiticeiro Jujutsu. Ainda que essas interferências ocorram, elas ocorrem de maneira que não é forçada. Com semi-conveniente, quero dizer que antes do início do confronto, o professor já era mostrado estando na área. Sem dar spoilers: ao fim do segundo arco do anime, as maldições montaram uma espécie de 'barreira'  para prevenir a interferência de Gojo-sensei, porém apenas dele. Acabou que ele conseguiu destruí-la, mesmo que quando a situação já estava basicamente resolvida. Nada disso muda que são estratégias de escrita por parte da autora para expor explicitamente o perigoso -  crescente - dos desafios a vir. Sem contar que, muitas vezes, ela faz o oposto e - convenientemente - coloca o professor para se ocupar com uma missão, assim não tendo como auxiliar seus alunos. Ah! Também tem vezes que o personagem joga as próprias para eles, pensando em torná-los mais preparados para futuros perigos.

No episódio 4 já temos um confronto com uma maldição de classe especial, as mais poderosas.

Outra coisa bacana é que, ao explicar como seu feitiço Jujutsu funciona, os efeitos dele se intensificam em troca. Parece bobo, porém é algo GENIAL. Sabe aquele anime que você não entendia como um personagem perdia minutos explicando seu golpe por razão alguma dentro da história? Bem, aqui é um pouco diferente. A necessidade de se explicar como uma golpe funciona é importante para o espectador/leitor não se perder e compreender as cenas - exceto nos casos em que seja proposital criar um mistério em cima disso -, mas pode criar alguns paradoxos, já que dá a impressão de ser uma 'burrice' dentro da história. Bem, a estratégia de Akutani foi a que citei, a de tornar o ato de explicar seu feitiço algo coeso a partir do momento que isso intensificará os seus efeitos nos alvos. Assim, o adversário pode até compreender o funcionamento e, por tal, tentar repelir, como pode simplesmente piorar e tornar mais confuso e complicado - tanto pelo efeito estar mais forte, como por não saber qual a exata aproximação para nulificá-la, sua fraqueza, etc -. Óbvio que existem outras formas de se justificar essas 'explicações'. Em algumas obras, isso é feito no 'pensamento' do personagem, então ele está refletindo sobre a própria técnica, enquanto acaba por a expor ao espectador/leitor. Como também temos mangás que nem JoJo e CDZ, em que as técnicas são explicadas por sadismo, como forma de torturar psicologicamente o adversário, por impacto ou por ambos. Inclusive, no caso de CDZ, os personagens são bem espertos e instruídos, de maneira que explicar uma técnica não é de tanto problema, já que muitas vezes o próprio alvo a compreende só por observação ou ela deixa de ter efeito após atingi-lo outras vezes - "Um mesmo golpe não funciona duas vezes conta um cavaleiro". 

Nobara na cena em que expõem os efeitos de seu feitiço ao adversário.

Outro momento muito bem executado em Jujutsu foi o "arco do torneio". Sim, o clássico arco que todo shounen tem! Uma faca de dois gumes, é ótimo para introduzir novos personagens e técnicas, mas pode se tornar perigoso, caso os próximos arcos não consigam manter uma boa curva. Veja o caso de Naruto, em que muitas pessoas veem o arco de torneio, lááá no início do mangá como o melhor. Bem, ele de fato é um dos melhores, no fim. Naruto é cheio disso, vemos um arco ótimo e intenso, entretanto, com arcos de sequência bem parados. Pior que isso são obras que reciclam o conceito de um arco trilhões de vezes. Dragon Ball faz isso com o arco de torneio. Os dois primeiros são daora, os demais...nem comentarei. Enfim, em JJK o arco de torneio propriamente dito começa com batalhas em equipe. Elas ocorrem num campo aberto e a única regra é não matar. Pode ir no 5v1, 1v1, 2v1, etc. A maioria acabou no 1v1, as vezes ocorrendo uma troca de lutadores ou uma eventual ajuda. Foi bastante dinâmico, todos os personagens mostraram bem as suas capacidades e indo casou bem com eventos importantes da história que vieram logo em seguida. Depois da primeira fase do torneio, haveria uma outra fase que SPOILERS LEVES seria 1v1, mas foi trocada por uma modalidade competitiva completamente diferente, creio eu que justamente para não haver uma reciclagem e redundância logo em seguida.
JJK evita esse tipo de coisa, tudo é direto, sem enrolação. Achei ótimo, 24 episódios em que ocorrem mais eventos relevantes e interessantes do que em 50 e além de um shounen tradicional. Não é maçante e parado, porém não é como se fosse ultra acelerado e cheio de informações que confundem. É dinâmico e com uma progressão agradável. 



O mais incrível é que a obra faz tudo isso sem ser exatamente 'inédita'. Quase tudo que há em Jujutsu não é exatamente original, e sim compilação e melhoria de elementos de outras obras famosas. Isso faz com que muitos pensem se tratar de uma cópia, porém NÃO é uma. A originalidade de Jujutsu está na execução dos seus elementos conceituais e narrativos. Vai ver a quantidade de coisas que acontecem em 24 episódios de outro shounen mainstream e compara com o que rola em JJK. "Ah, mas alguns - tipo Naruto e Bleach - eram cheios de filler". Beleza, a primeira temporada de JJK adaptou 63 capítulos do mangá. Veja e 63 capítulos de um dos que citei teve o mesmo tanto de eventos e conceitos apresentados. 

Sobre os personagens, a maioria é bem interessante, tanto que nem sei dizer qual é o meu favorito. Aqui existe uma estratégia semelhante a de One Piece: os personagens são introduzidos com o background de forma bem rascunhada. A medida que aparecem mais e determinados eventos acontecem, mais partes de sua história anterior a primeira aparição são mostrados. Ou seja, o foco é em te fazer gostar do personagem pelo design, personalidade, técnicas e ações no presente. O seu background fica num mistério, servindo como uma às na manga na hora de mostrar sua determinação e suas razões para lutar. Antes que me ponham em dúvida: Oda fez isso mais de uma vez em One Piece. O próprio background do LUFFY demora CENTENAS de capítulos para ser plenamente apresentado. Sabe quando o Sabo apareceu - em flashback - a primeira vez? Pois é, Marineford. Nico Robin só teve o seu passado revelado em Water 7, mais de 100 capítulos após entrar no bando. Sanji? Apareceu a primeira vez no capítulo 43 e só teve o seu passado revelado na saga Whole Cake Island, que começou no capítulo 825, sendo aquela que precede a atual saga do mangá, País Wano. Quase 800 capítulos depois de sua introdução. Zoro? Até hoje não sabemos direito do seu passado, Wano está mostrando umas coisas, mas nada realmente concreto, além da cena do ferreiro de sua vila. Primeira aparição? Capítulo 3.


Enfim, não é tão diferente em JJK. Até agora o passado do Itadori não foi bem mostrado, só sabemos que ele fez uma promessa ao avô, de não cometer os mesmos erros que ele e morrer sozinho, o que é mostrado no episódio 1. Fora isso, quase nada. Pode ser que ele nem tenha um passado relevante o suficiente para ser contado, o que mostra como essa técnica narrativa é boa. Caso o autor veja necessidade, pode eventualmente introduzir esse passado. Caso não queira, só deixar como se não houvesse. É extremamente conveniente. O próprio arco whole cake island só ocorreu por causa do passado do Sanji, porém serviu como motor de propulsão para bastante coisa da trama. 

Eu não esperava nada de JJK, mas terminei recebendo uma obra bem consistente e de ótima qualidade, realmente curti. Não é como se fosse EXPECIONAL, a questão é o quão bem executada é. Não vejo como um shounen de ação - hoje - tenha como dar desculpa para ser qualquer coisa num nível inferior a JJK, sinceramente. É um baita exemplo de como reciclar e melhorar ideias sem ser uma cópia. Dito isto, tentarei experimentar algumas coisas que estou fazem uns anos empurrando para não ver, como Kimetsu e SNK (já fazem 10 anos que evito ver snk!!).

É isso! Desculpem-me se o post pareceu meio corrido, a minha intenção não era de fazer uma review propriamente dita, mas espero que esteja o suficiente para entenderem o que vi de interessante nele.

Até breve, cuidem-se!